Jornada e destino. Sobre sonhar com o futuro e esquecer o presente
Todos buscamos uma linha de chegada, é o que nos move. Um projeto de vida, seja ele qual for — viajar, subir na carreira profissional, construir uma família, comprar uma casa — , é sempre um projeto, o qual focamos nossas energias em concluir.
Sonhamos tanto com esses projetos que nossa mente costuma nos colocar lá, onde gostaríamos de estar.
O problema é que ela nos tira do aqui e agora, colocando todas nossas esperanças em um momento de felicidade que nos aguarda lá no futuro. Só que não é bem assim…
A chegada ao objetivo e o fim do desejo.
Na mitologia grega, Eros era o deus do amor, nascido de Poros que representava a abundância e Pênia que representava a pobreza.
Segundo Platão, o mito de Eros servia para descrever o conceito de amor, o qual surge do desejo, enquanto o desejo surge da falta.
Amor = Desejo = Falta
Todas nossas aspirações se resumem nessa equação e a dura realidade é que ela acaba — desejamos por não termos e ao conseguirmos deixamos de desejar. Fim.
Vejamos um desejo material como exemplo: ao sonharmos com um novo Smartphone, nossas energias se voltam para essa causa, comprar o celular, ao estarmos com ele em mãos, o desejo se foi e por mais que o celular lhe traga certo sentimento de prazer ao usá-lo, ele agora passou a ser apenas mais um acessório do seu cotidiano.
Para Schopenhauer, essa condição se reflete como um pêndulo, em que a vida oscila entre o querer e o conseguir.
“É necessidade, carência, logo, sofrimento, ao qual consequentemente o homem está destinado originariamente pelo seu ser. Quando lhe falta o objeto do querer, retirado pela rápida e fácil satisfação, assaltam-lhe vazio e tédio aterradores, isto é, seu ser e sua existência mesma se lhe tornam um fardo insuportável. Sua vida, portanto, oscila como um pêndulo, para aqui e para acolá, entre a dor e o tédio.”
Arthur Schopenhauer
Mas então, devemos deixar de ter objetivos?
Jamais! Sonhar é o que alimenta nossa vida. Ter aspirações e desejos fazem parte de nossa condição humana. Como eu disse no início, a linha de chegada é o que nos move. Porém…
Chegar na linha de chegada é a comprovação da vitória, mas se você não aproveitou a corrida, a verdade é que você perdeu seu tempo.
A vida é apenas uma jornada com infinitos destinos, portanto, a felicidade só é encontrada ao entendermos que não é a linha de chegada que importa, mas sim o prazer de correr o trajeto.
A felicidade no agora
Sonhar com o futuro nos deixa feliz, nos dá um motivo para continuarmos. Porém, somente ao aproveitarmos o presente podemos ter uma felicidade completa. Do contrário, permanecemos apenas coletando lapsos de alegria pelo caminho.
Claro que não tem como ser carnaval o ano inteiro, a felicidade nem seria possível dessa forma. Um dia de sol, por exemplo, não tem muito mais valor após vários dias de chuva?
O mesmo se dá com a vida, repleta de altos e baixos, formando um perfeito equilíbrio.
Por isso nós precisamos olhar para as pequenas coisas do cotidiano, pois os objetivos que tanto buscamos jamais serão capazes de preencher toda a felicidade de nossa existência. Ouvir uma música no caminho do trabalho, conversar com os amigos, rir de uma piada ou de um vídeo, ler um livro, sair para jantar, é nesses momentos que preenchemos o vazio, todos eles são repletos de valor, basta estarmos presentes para enxergar.
Como viver no presente?
Em um mundo imediatista e ultra conectado, as qualidades da paciência e da atenção são cada vez mais raras. Com nossos olhos hipnotizados pelas telas dos smartphones, viver no agora é uma tarefa cada vez mais difícil.
Mas acredito que ainda seja possível nos “conectarmos” com o presente, por isso aqui vão três dicas para começar.
Meditação
“Não viva no passado, não sonhe com o futuro, concentre a mente no momento presente”
Buda
Parece até clichê dar essa dica, mas a verdade é que funciona. A meditação, ou mindfulness como vem se popularizando, é uma das melhores formas de treinarmos nossa mente para vivermos o momento.
Você não precisa se converter ao budismo ou qualquer tipo de religião para praticá-la. A meditação vem sendo difundida por todo o mundo e hoje conta com a tecnologia ao seu lado para ajudar os iniciantes. Aplicativos como o Headspace, Calm e Waking up possuem milhares de usuários que atestam os benefícios da meditação com apenas algumas semanas de prática.
Flow
Pense nos momentos em que você se perdeu na hora, seja curtindo com os amigos, praticando algum hobby ou até mesmo trabalhando. Todos esses momentos constituem um estado de flow.
A teoria, desenvolvida pelo psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi, descreve o estado de fluxo como um momento de verdadeira felicidade, onde vivemos o presente momento com alto desempenho de nossas atividades e perfeita harmonia entre corpo e mente.
Quando fazemos algo que gostamos, o estado de flow aparece naturalmente, por isso precisamos cultivar esses momentos e darmos mais espaço para eles no nosso dia a dia.
Estoicismo
A geração de expectativas com o futuro é uma das principais causas de nossa infelicidade. Por isso a filosofia estóica prega por nos livrarmos desses pensamentos no amanhã, pois não temos controle sobre ele.
Somente o presente está ao nosso alcance, é nele que temos o controle, é nele que precisamos encontrar a felicidade.
As lições dos estóicos nos mostram como desenvolver o controle sobre a vida. Em seus ensinamentos reside o olhar sóbrio da existência, o olhar de uma vida feliz e tranquila no aqui e agora.
Saber onde queremos chegar, traçar metas, construir sonhos… todos eles são essenciais para a vida. Nós só precisamos lembrar que eles não são a finalidade do caminho, mas uma parte do caminho em si, assim como cada momento do presente.
“É bom ter um fim para a jornada, mas é a jornada que importa, no fim.”